O Hospital Nossa Senhora da Conceição (HNSC), em Tubarão, pode deixar de ofertar serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir do dia 1º de julho. Ao menos, foi isso que a Rede Santa Catarina, mantenedora da unidade hospitalar, anunciou em fevereiro em oficio encaminhado ao Governo do Estado. O Infosul teve acesso com exclusividade ao documento.
À época, a Secretaria de Estado da Saúde (SES) foi notificada de que a instituição renunciaria os serviços de Pronto Atendimento Aberto, Maternidade, Pediatria, UTI Neonatal, UTI Pediátrica e Neurologia, caso não houvesse o equilíbrio financeiro do contrato vigente.
Segundo a administração da Rede Santa Catarina, o hospital de Tubarão projeta um déficit SUS superior a R$ 75.6 milhões para 2024, o que inviabilizaria a continuidade desses atendimentos.
Desde então, a direção do HNSC diz aguardar uma proposta do Estado. Essa espera, entretanto, termina no dia 30 deste mês. Esse foi o prazo estabelecido para que o governo estadual indicasse um acordo.
Conforme a instituição, esse déficit já foi matéria de outros oito ofícios enviados à pasta no decorrer de 2023. A expectativa era para que o novo Programa de Valorização dos Hospitais (PVH) adequasse os parâmetros orçamentários, mas isso não ocorreu com o HNSC.
De acordo com a SES, neste ano de 2024, o Estado tem repassado cerca de R$ 9,4 milhões mensais para a unidade. Desse montante, R$ 1.774.037,82 é referente ao incentivo fixo do PVH. O restante, é distribuído aos serviços de Média e Alta Complexidade, Ações Estratégicas e Compensação (FAEC), mutirões de Cirurgias Eletivas, Rede Cegonha e Rede de Urgência e Emergência.
Em 2022, o Estado repassou ao hospital um total de R$ 88.654.652,61; já em 2023, R$ 98.455.130,06.
O QUE DIZ O ESTADO
Em nota enviada à reportagem do Infosul, a Secretaria de Estado da Saúde disse compreender a importância do Hospital Nossa Senhora da Conceição para Tubarão e toda a região Sul de Santa Catarina.
“A SES vem mantendo diálogo e existe a previsão de uma nova agenda com a entidade que gerencia o Hospital de Tubarão no final do mês de junho. Também foi formalizado junto ao Ministério da Saúde a situação, considerando que o pagamento de parte dos serviços realizados é de responsabilidade do Governo Federal, e a pasta entende que o Governo Federal deve aportar maiores recursos”.
Em paralelo, a secretaria ainda destacou que tem buscado caminhos para a situação apresentada e garantindo a manutenção dos atendimentos via SUS para que a população não seja prejudicada.
Entre as ações, existe a chamada Tabela Catarinense, que paga aos hospitais, incluindo o HNSC, até seis vezes mais nos procedimentos realizados pelo SUS, considerando a tabela do Governo Federal que não é revisada desde 2013. Veja:
O Gerente Regional de Saúde de Tubarão, Hermes Costa Cardoso, também atendeu a reportagem do Infosul para dar detalhes sobre o impasse entre o Governo do Estado e a Rede Santa Catarina.
“São muitas as conversações que estão sendo realizadas entre as equipes técnicas do Estado e do Hospital. Estamos empenhados em fazer a checagem de todos os valores, sejam eles quais forem, para que possamos avaliar todas as possibilidades. Dias atrás, por exemplo, a equipe de contratualização da Secretaria de Estado da Saúde esteve no Conceição para averiguação dos valores exercidos em diversos serviços SUS. Estamos fazendo comparações para vermos o que pode ser melhorado e ajustado”, destacou.
De acordo com o profissional, “nenhum serviço SUS deixará de ser ofertado no Hospital Nossa Senhora da Conceição. Não há essa possibilidade”, enfatizou.

CONSEQUÊNCIAS
Atualmente, o HNSC é referência para todo o Sul de Santa Catarina. Para se ter uma ideia, entre agosto e dezembro de 2023, o Pronto Atendimento da unidade recebeu 31.972 pacientes de diferentes cidades.
Esse número expressivo se dá pelo conceito “Porta Aberta” da Emergência, em que o setor assiste a todos que procuram atendimento, independentemente da gravidade em que se encontra o paciente.
Com a eventual renúncia, o setor passa a ser regulado pelo Estado e somente os pacientes com encaminhamentos serão atendidos.
As gestantes também serão prejudicadas. Pois, caso não tenham condições financeiras para ter um parto com serviço particular, vão precisar procurar outra cidade para terem seus filhos via SUS. O mesmo acontecerá com as crianças, inclusive as recém-nascidas, que deixarão de ter atendimento gratuito no hospital da Cidade Azul.
Internações e atendimentos neurológicos também serão rompidos sem o equilíbrio financeiro previsto. Consultas com médicos especialistas na área e cirurgias eletivas alusivas à especialidade serão excluídas das atividades SUS ofertadas pelo hospital.

DESPESAS E RECEITAS
No início do ano, em matéria divulgada também pelo Infosul, o HNSC havia destacado que embora seja uma unidade para atendimentos de Alta Complexidade, mais de 60% dos pacientes que procuram a Emergência são atendimentos de Saúde Básica. Desses, a maioria são de Tubarão.
Por essa razão, o custo para manter o setor fica elevado e acaba prejudicando os atendimentos prioritários. Pois, segundo defende a direção da instituição hospitalar, o impasse seria amenizado caso a Cidade Azul tivesse uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), conforme indica a Portaria nº 1.020/2019, do Ministério da Saúde, que prevê a construção de uma unidade de Porte 2 para municípios com população superior a 100 mil habitantes.
Em média, para manter a Emergência “Porta Aberta”, o HNSC tem um custo mensal de R$ 1.817.052,17, incluindo materiais, honorários médicos, pessoal, utilidades públicas, administrativo, terceirizadas e gerais.
Para equalizar o caixa, inclusive, também em fevereiro, o então diretor do hospital, Fábio Tadeo Teixeira, chegou a solicitar à Prefeitura de Tubarão o incremento mensal de R$ 1.053.612,01 nos repasses para o custeio das atividades no setor, mas a Administração Municipal não atendeu ao pedido.
Mesmo o Hospital Nossa Senhora da Conceição atendendo pacientes de todos as cidades da região, apenas quatro contribuem financeiramente para a manutenção da emergência da unidade:
A título de comparação, a Prefeitura de Imbituba repassa R$ 539.194,66 ao mês ao Hospital São Camilo. No ano, a Administração Municipal da Capital da Baleia Franca colabora com R$ 6.470.335,92 para a manutenção da unidade hospitalar local. O montante é 70% maior que o valor anual repassado pelos quatro municípios da Amurel ao HNSC.
Em síntese, conforme dados do próprio Hospital Nossa Senhora da Conceição, enviados à Regional de Saúde de Tubarão, somadas as receitas e excluindo eventuais emendas, a unidade recebe, por mês, uma média de R$ 10.015.877,78.
UNIDADE DE PRONTO ATENDIMENTO
A Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Tubarão começou a ser construída em 2010, ainda no governo do saudoso prefeito Dr. Manoel Bertoncinni, na rua Januário Alves Garcia, na margem esquerda, Centro.
De lá para cá, diversos impasses surgiram.
Em 2014, por exemplo, a obra foi paralisada. Os trabalhos só foram retomados em meados de 2020.
Anos mais tarde, a Prefeitura de Tubarão divulgou que o município não teria capacidade para ter uma UPA 24 horas. Então, foi anunciado que a unidade seria um Centro de Atendimento em Saúde.
14 anos se passaram desde o anúncio do projeto, e a população continua sem atendimento no local.
No ano passado, o Ministério Público chegou a solicitar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para a instalação da UPA na cidade, justamente para desafogar a emergência do Hospital Nossa Senhora da Conceição, que desde então sofre constantemente com superlotação. A Fundação Municipal de Saúde argumentou que o município não precisava abrir a unidade, pois já auxiliava o setor por meio de convênio.
Jairo Cascaes, meses depois de assumir o Executivo, reconsiderou a ideia inicial da proposta e anunciou que a estrutura construída na Margem Esquerda da cidade seria sim uma UPA.
A expectativa do gestor era inaugurar a estrutura em julho deste ano, mas haverá atraso. O projeto de readequação da estrutura ainda está sob análise dos engenheiros da Secretaria de Estado da Saúde. Diversas diretrizes construtivas já foram alteradas desde que o projeto foi anunciado.
Assim, após aprovação do desenho e adequação da estrutura, a Administração ainda precisará organizar os detalhes da licitação ou chamamento público.
A intenção é que o município não faça a administração da UPA e nem que ela inicie as atividades funcionando 24 horas/dia, mas que essa logística seja pensada e executada por uma Organização Social de Saúde (OSS).
Caso seja desta forma, o município somente repassará um valor mensal à administradora, que ainda poderá angariar recursos com o Estado e também Governo Federal.
Reportagem inédita, publicada inicialmente na edição impressa do Infosul no mês de junho.